FRANCISCO NUNES DE OLIVEIRA, (CHICO NUNES)
Nasceu em Palmeira dos Índios, no dia 04 de maio de 1904, na Rua Costa Rego, filho de José Nunes da Costa e Francisca Nunes de Oliveira.
Tido como o maior repentista em todos os tempos do nordeste brasileiro na opinião de Câmara Cascudo, que o considerou como o “Bocage do repente nordestino” e Mário Lago.
Aliás, na época, o escritor e ator global, Mário Lago, compositor da eterna música “Amélia”, ao fazer um filme em Alagoas, se apaixonou pelas glosas de Chico Nunes.
Mário Lago estava em Viçosa filmando “São Bernardo” filme de Leon Hirszman, (baseado no livro de outro palmeirense Graciliano Ramos).
Como não conseguia dormir cedo, ficava perambulando pelas ruas de Viçosa, ao ouvir uma música seguiu o rastro e viu no fim da rua uma porta entreaberta.
Na música e nas conversas, o dono do bar, Zé Cavaquinho lembrava versos de improviso de Chico Nunes.Resolveu conhecer a história dele.
Escreveu em 1975, o livro: “Chico Nunes das Alagoas”, que virou bestseller no gênero.
Em Palmeira, a rua do baixo meretrício, conhecida como Pernambuco Novo, onde Chico Nunes gostava de viver, depois de sua morte, recebeu o nome do poeta improvisador.
Pelo seu lado pejorativo e imoral para declamar suas poesias, era visto com receio pela Igreja católica e pelas famílias locais, embora fosse tratado como um rei pelas prostitutas. Seu apelido era Rouxinol de Palmeira.
Certa feita, o governador Costa Rego, foi rigoroso no combate ao jogo de bicho em Alagoas, e depois de acaba-lo sob forte coação e perseguição aos contraventores da época, esteve em visita a Palmeira dos Índios, em uma visita ao prefeito da época. Ouvira falar da fama de Chico Nunes e quis conhece-lo.
Chico por sua vez, atendeu o pedido e fez muitos repentes para o governador, mas também guardava mágoa do mesmo, pelo fato de ter acabado com o jogo do bicho. Mesmo sabendo da sua brabeza, pediu ao governador que não ficasse com raiva da glosa que iria fazer e então declamou num improviso:
“Existe um governado
Que se chama Costa Rego
Que tomou o meu emprego
Porque o jogo acabou
Isso me desmantelou
Pois o destino assim quis
A sorte me contradiz
Eu fiquei desmantelado
Largue de ser desgraçado
Seu Costa Rego infeliz.”
O governador o contemplou com uma nota de mil réis que naquela época era muito dinheiro.
Sua irreverência muitas vezes descia as palavras de baixo calão.
Uma vez foi até Gerum de Itabaianinha, em Sergipe enfrentar desafios de repentistas locais que acabaram derrotados pelo seu talento. Hospedado num hotel, cuja dona não gostou da derrota dos conterrâneos, provocou:
“Se o senhor é um poeta afamado, digaí alguns versos. Chico respondeu:” Dona eu só falo a verdade “– Pois então diga”.
Diante da mulher e dos sergipanos presentes, Chico Nunes mandou ver:
“Só quero que o Criador
No mundo jogue uma gripe
Se eu voltar a Sergipe
De onde agora me vou
Prefiro ver o horror
Do mundo em peste daninha
C
om uma febre e uma morrinha Destruindo tudo que é lar
A ter que um dia voltar
Em Gerum de Itabaianinha
Mas se apesar disso tudo
Eu a vergonha perder
E por aqui aparecer
Quero que um jegue raçudo
Muito fogoso e taludo
Sem piedade e receio
Me pegue pra seus anseios
Bem de eito pelos quartos
Me bote no chão de quatro
Me atoche e me rasgue no meio ...”
Determinado dia participava de uma festa na casa de um cidadão chamado Zé Nicolau, que não nutria bom relacionamento com o poeta.
No auge da festa, comeram um bacalhau e deram a espinha para Chico que se sentindo humilhado reagiu com poesia:
Da espinha do bacalhau
Mandei fazer uma vareta
Pra enfiar na boceta
Da mãe de Zé Nicolau
Saí da minha cidade
Pra vir dançar neste forno
Onde a dona da casa é puta
O dono da casa é corno
E a filha mais nova que tem
Já sabe fuder no torno.”
Em 1942, a 2ª Guerra Mundial ameaçava a todos e o temido capitão Lucena provocou Chico Nunes dizendo que iria leva-lo para a Itália para participar da Guerra. Chico se defendeu com um improviso:
“Não me levem para a guerra
Não me façam essa surpresa
Que eu não tenho a natureza
Pra ver meu sangue na terra
Me deixem viver na serra
Por dentro desses buracos
Misturado com os macacos
Sujeito à sede e a fome
Depois coloquem o meu nome
No livro dos homens fracos"
Outra vez um time de futebol de Palmeira dos Índios, foi jogar em Santana do Ipanema e levaram Chico Nunes.
Foram almoçar no hotel de Zé Petronilo, que ficava próximo a um chiqueiro e já era conhecido como pela falta de higiene reinante no local. Chico reagiu ao convite dizendo:
“Prefiro entregar meu pé
Prá uma serpente morder
Com Cristo me malquerer
E acabar perdendo a fé
Brigar com uma cascavé
Me atracar com um crocodilo
Beber toda a água do Nilo
Do boi só comer o osso
Mas não me falem em almoço
No hotel de Zé Petronilo”.
Num épico desafio com o também poeta Pedro Basílio cujo o mote era “Melhor do que tu”, Pedro Basílio afirmou:
“ Sô rico, sô potentado
Só um poeta do direito
sô um homem de respeito
Sempre fui considerado
Como um cantador honrado
Desde o norte inté o sú
Inté o Barão de Traipú
Me daria confiança
Vivo cheiro de esperança
Eu sô mio do que tu.”
Chico Nunes, respondeu na bucha humildemente:
“Sô ladrão de mandioca
Só a lama de um barreiro
Sô do tipo cachaceiro
Sô imbuiá, Sô minhoca
Sô como sapo na toca
Sô badalo de cururu
Sô puleiro de urubu
Sô chocalho sem badalo
Sô um ladrão de cavalo
Eu sô mio do que tu”
Ainda nessa mesma disputa, versejou:
“Sô um tipo sem futuro
Desses que não vale nada
Sô igual a uma levada
Como bagaço de munturo
Sô um recanto de muro
Onde só tem cururu
Só igual a um tatu
Dentro do buraco fundo
Sô a desgraça do mundo
Eu sô mio do que tu”.
Assim Chico Nunes finalizou:
“Já perdi a cirimônia
Eu ando cambaliando
Andam até me chamando
De fumado de maconha
Ajuntei-me com uma sem vergonha
Levei ponta pra chuchu
Fui corno em Caruaru
Viado no Maribondo
Mas mesmo dando o redondo
Eu sô mió do que tu ...”
A platéia foi ao delírio!
Em 1951, foi acusado da morte do jogador de baralho Leopoldo, que havia roubado umas galinhas.
O motivo do crime: Chico tirou onda de Leopoldo chamando-o de velha raposa em suas rimas e a coisa desandou em briga. Chico tinha um braço aleijado e o jeito foi apelar para uma faca peixeira.
Foi preso e depois que saiu da cadeia tentou o suicídio atirando-se de cima do prédio da Maçonaria, hoje sede da OAB.
Faleceu no dia 21 de fevereiro de 1953, aos 49 anos de idade, sendo a causa de morte: nefrite crônica (inflamação dos rins).
Não deixou uma única linha publicada.
Era racista, mas ironicamente morreu nos braços de uma preta, Maria Tercília de Oliveira, a quem ele chamava carinhosamente de “Nega”.
Em seus últimos momentos de vida assim se expressou:
" Quando badalar o sino
Da catedral ou matriz
Um pergunta e outro diz
Quem tomou novo destino?
Então responde o menino:
Foi Chico, não pôde viver
Dizem que sabia fazer
Tanto verso improvisado
É certo, está sepultado
Faz pena Chico morrer
Felicidade chegou
Em minha porta bateu
Entrou e não me conheceu
No mesmo instante voltou
O castigo se aproximou
Sem nada também dizer
Foi somente pra trazer
Doença triste para mim
Até que estou vendo o fim...
Faz pena Chico morrer”